Jurada de morte, espancada e obrigada a fugir, a
agricultora amazonense Nilcilene Miguel de Lima é citada pela
organização Anistia Internacional como exemplo da violência a que vêm
sendo submetidos ativistas defensores de direitos humanos no continente
americano.
''Eu não sei se vou resistir. Não aguento mais
viver escondida, de favor, cada dia em um lugar, trancada no quarto'',
disse Nilcilene, em entrevista à BBC Brasil. "Estou pedindo socorro
pelos produtores e seringueiros. Estão matando todos nós."
Antes de ser ameaçada por madeireiros e grileiros, a produtora rural
era presidente de uma associação que representa famílias de uma
comunidade de pequenos produtores e extrativistas em Lábrea, cidade no
Amazonas próxima à fronteira com o Acre e Rondônia.
Além dela, outros quatro brasileiros estão entre
os 57 casos de ativistas do continente americano que foram mortos ou
vivem sob ameaças e cujas histórias são citadas no relatório da Anistia Transformando dor em esperança - Defensoras e defensores dos direitos humanos nas Américas, divulgado nesta sexta-feira.
Impunidade
O documento diz que houve um alarmante aumento
nos casos de violência contra ativistas nas Américas, seja por parte das
forças de segurança, de paramilitares ou facções de crime organizado.
Para a organização, o Brasil não tem oferecido a
proteção adequada a ativistas ameaçados. "Estamos muito aquém de um
sistema de proteção efetivo", disse à BBC Brasil Átila Roque, presidente
da Anistia Internacional Brasil, que também cita a impunidade como uma
das principais causas da situação.
"Houve avanços com a criação da Secretaria de
Direitos Humanos, mas infelizmente ela não dá conta (de proteger os
ameaçados). É preciso vincular vários níveis do Estado, como por exemplo
uma Justiça que pune os acusados de intimidar ou atacar ativistas."
"O caso do Brasil é simbólico porque mostra o
tipo de desafio enfrentado para que haja o desenvolvimento de um país,
mas que promova justiça e igualdade", disse.
Proteção
Oficialmente, Nilcilene é amparada por um
programa de proteção a defensores de direitos humanos da Secretaria de
Direitos Humanos da Presidência da República.
Ela disse à BBC Brasil que não tem mais recebido a verba prevista pelo programa para ajudar na sua proteção.
"E os guardas que me acompanhavam só ficaram até
caírem numa emboscada. Madeireiros, pistoleiros e grileiros atiraram em
uma casa que a gente tinha passado. Mas conseguiram matar só o cachorro
que vigiava", disse ela.
Consultada pela BBC Brasil, a assessoria de
comunicação da Secretaria de Direitos Humanos disse que Nilcilene
continua sob proteção do programa. "Nem a Força Nacional de Segurança
Pública e nenhum dos policiais que a protegiam abandonaram suas
funções", disse a assessoria.
Para Nilcilene, apenas o acompanhamento dos
policiais não resolve, pois a segurança teria de ser fornecida para toda
sua comunidade, para que eles pudessem continuar a viver no local.
"Semana passada mataram mais um vizinho meu,
dentro da casa dele. Ele tinha mulher, seis filhos e dois netos. Não
quis vender a terra para os grileiros e morreu", conta a agricultora. "A
família toda teve de fugir. Cada um que morre ou que tem de fugir, eu
fico mais doente e pensando se um dia vou conseguir voltar."
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